Eu estava visitando os meus avós quando minha avó veio do quarto com um envelope amarelado e me entregou.
Dentro estavam todos os bilhetinhos e desenhos que fiz para ela desde que tinha 2 anos de idade.
Um deles me chamou a atenção.
A velhinha me fez chorar…
Da minha avó ganhei minha primeira maquina fotográfica quando tinha 7 anos. Desde então não parei de clicar. Trago comigo sempre uma câmera. Tudo é motivo digno de uma foto: uma calçada, um pôr-do-sol, um desconhecido.
Mexendo nas coisas do meu avô encontrei um álbum velho. De tão antigo, a capa xadrez (do que um dia foi) azul e branco já estava em farrapos. Ao abrir, me deparei com um tesouro.
O álbum pertenceu ao meu bisavô que não cheguei a conhecer. Páginas de papel preto traziam fotografias e números escritos em giz. A maioria datava de 1920 a 1935 e fora tirada na cidade em que meu biso morava: Rio de Janeiro.
Sentei com meu avô – hoje com 86 anos – e deixei ele me guiar pelas histórias. Lúcido, vi em seus olhos lembranças vivas de um tempo não tão distante. Simples e elegantes, os retratos mostram um época gloriosa e boa parte da infância dele.
As minhas fotos, tolas, eu guardo pra mim. As de meu bisavô, estas sim, não pude deixar de compartilhar.
quando as linhas se tornam seus próprios demiurgos, quando assisto, qual um milagroso ato inconsciente, ao nascimento no papel de frases que escapam à minha vontade e que, inscrevendo-se na folha apesar de mim, ensinam-me o que eu não sabia nem acreditava saber, gozo desse parto sem dor, dessa evidência não concertada que consiste em seguir sem esforço nem certeza, com a felicidade dos espantos sinceros, uma pluma que me guia e me transporta. então, tenho acesso, na plena evidência e textura de mim mesmo, a um esquecimento de mim que confina com o êxtase, e sinto a bem aventurada quietude de uma consciência espectadora.”
Muriel Barberry